A ideia de Deus, quer na perspectiva clássica de Santo Agostinho, quer de Santo Anselmo ou São Tomás de Aquino não difere muito da de Hegel. A criação do universo sem o seu Criador comprometeria a intemporalidade e imutabilidade de Deus; a sua omnipotência e omnisciência.
Quer a teoria da criação ex nihilo (do nada) desenvolvida por Santo Agostinho, que foi a base do teísmo cristão clássico, quer de São Tomás de Aquino ao dizer que «não podemos saber o que é Deus mas apenas o que ele não é»; ou, finalmente, Santo Anselmo com a brilhante teoria: «Deus é algo perante o qual nada de maior pode ser concebido» nenhuma destas teorias resolveram a questão da existência de Deus. Todas estas tentativas filosóficas da demonstração racional de Deus têm gerado confrontos ao longo dos séculos e adeptos contra e a favor: Crentes e cristãos de um lado e ateus e agnósticos (onde me situo) do outro. As vezes, também juízos de valores erróneos de ambos lados. Bons são os crentes, os cristãos e maus são os ateus, os ímpios e os hereges. Não entendo que seja assim. Se assim fosse, a dignidade e os direitos humanos não tinham a importância que hoje têm nem a protecção e defesa que o Direito Internacional lhes confere, inclusive o direito a liberdade de religião ou de não ter religião alguma.
Todo o homem tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou de crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, isolada ou colectivamente, em público ou em particular (art. 18º, Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 10 Dezembro 1948).
Como sabemos, essa não foi a postura, durante séculos, da Igreja Católica. Ser ateu ou agnóstico não significa ser desumano ou insensível a pobreza, à dor e ao sofrimento, bem pelo contrário: Há uma consciência muito nítida de que o bem da humanidade é para praticar de imediato a todos que dele necessitam. O sofrimento não é um preço diferido que se tem de pagar para a cura do mal (redenção dos pecados) num julgamento final, no Além. A postura do agnóstico prende-se com a existência de Deus. Para ele, não é possível demonstrar a existência de Deus mas também é impossível demonstrar o contrário. Já o ateísta não acredita em Deus, embora exista uma relação entre o agnóstico teísta ou ateísta, conforme a crença ou não em Deus.
Há de facto uma clivagem entre fé e conhecimento. A tradição filosófica parte do conhecimento – razão - para justificar a crença. Mas a crença é o fundamental. Assim,
nas palavras de Santo Anselmo, um dos grandes racionalistas do pensamento religioso: Eu não tento, Senhor, atingir a tua eminente majestade, porque a minha compreensão não lhe é, de forma alguma, igual. Mas desejo compreender um pouco a tua verdade, aquela verdade que o meu coração ama e na qual acredita. Porque não procuro compreender para poder acreditar; mas acredito para poder compreender. E também acredito que, se não acreditar, não compreenderei ( Prosologion, capítulo 1).
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