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quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Peripécias de catraios!

Artur/Leiria
- Malditos grilos que não me deixam dormir! Era a minha mãe levantada a lamentar-se e a tentar que uns quantos grilos que cantavam às tantas da manhã casa adentro se calassem.
Mal sabia ela que naquela manhã de um dia de verão, no início da década dos cinquenta, este catraio foi entiçado a escapulir-se por um colega, que à distância me ia dando sinais para irmos brincar. Sem meias medidas, logo ao notar que a minha mãe não me estava vendo, safo-me por carreiros além e atalhos, à velocidade de estafeta, tentando criar distância considerável entre nós, para que no caso de ela chamar por mim; se não a ouvisse, era como se ela não me estivesse a chamar! Como era de se esperar, já tinha o colega da aventura ofegando afilitivamente bem perto de mim; perguntando se a minha mãe não tinha visto eu safar-me. Claro que na altura isso era irrelevante, o que interessava é que a meu ver, estava livre para enfrentar toda a peripécia que se nos deparasse! Incluindo a roupa à pele...
Naquele dia perguntamo-nos o que íamos fazer, ao que eu propus em irmos apanhar grilos. Logo, decisão tomada, caminhamos por campos propícios para residência  de tais predilectos bichinhos. Ouvidos à escuta, e não levou muito a ouvi-los cantarolando de contentes, agradecendo ao seu deus pelo dia maravilhoso que lhes ia oferecendo! Mal sabiam eles que estes dois algozes, como aves de rapina, iriam sacar-lhes alguns membros de família… A astúcia faz parte do sucesso nestas aventuras de cachopos de aldeia. Ora, para quem não conhece o grilo, este constrói uma toca pequenina no meio de ervas de meia altura e à frente desta como cartão-de-visita, faz um terreirinho muito liso onde passa horas cantando os seus versos, talvez aos seus amores, que a mãe natureza tão generosamente lhes ofertou!
Pé-ante-pé, lá íamos tentando descortinar através da sua música onde estava o palco com o seu artista cantando ao vivo.
- Ah! Ali está ele, era um de nós a apontar onde se estava a realizar a solo tão adorável concerto musical!
- Aguenta, eu apanho-o. Zás, que havia de se tapar a entrada do bastidor do palco para que interditasse a retrocesso ao mesmo de tão castiço intérprete…

Ah, este já cá canta! Colocando-o temporariamente debaixo do quico na cabeça do meu comparsa…
Repetidamente esta operação delicada se ia repetindo, com a cabeça do colega já cheia de grilos debaixo do quico...
- Alto aí pá! Temos que fazer-lhes umas gaiolas com alface dentro para comerem, foi o colega a lembrar.
- Boa ideia, disse eu, o meu avô costumava trazê-los dentro dum vão de cana rachada para pôr a alface, servindo também de gaiola, e tapava com uma rolha de carrasca de pinheiro que fazia; tens uma navalha não tens?

- Claro, um bom marinheiro aparelha-se em terra, disse ele. Depois de termos feito algumas gaiolas, porque na área havia os materiais necessários para construção das mesmas, foi assunto resolvido num abrir e fechar de olhos. Continuamos na faina da apanha, sem notarmos que o tempo ia correndo a bom passo, e a fome que por graça não nos apoquentava, onde o sucesso se expandiu ao ponto de que já tínhamos grilos para dar e vender; mesmo depois de alguns teimosos, porque não saíam com a palhinha das cócegas, levavam com uma ‘urinadela’ na testa!
Regressamos a aldeia, saltitando ao pé-coxinho de contentes, sem que fizéssemos a mínima ideia, de que havia de haver sardinha fresca lá em casa!
- Por onde andou o menino todo o dia, foi a minha mãe a perguntar, um dia inteiro sem comer e eu farta de chamar por ti. Vais ao ‘lenheiro’ buscar um pau para apanhares com ele e depressa.
Lá fui eu choramingando, a antecipar as que iam cair no pêlo, e eu com os ‘grilinhos’ dentro das gaiolas de cana nos bolsos, no meio das que iam chovendo no rabo, abriram-se algumas gaiolas e como é de esperar: cadeia aberta há que escapar, e os meus prisioneiros foi mesmo isso que fizeram, mas como que a gozarem comigo e sem vergonha; cantavam… cantavam… noite fora..., ao ponto da minha mãe, que não sabia da fuga das minhas presas, a levou a lamentar-se e a dizer noite fora:
- “ Malditos grilos que não me deixam dormir!”
Perdoa-me mãe lá dos céus, porque eu não media o que fazia…

2 comentários:

  1. São lavras gravadas na memória que esta não deixa que se apaguem. Parabens pela forma brilhante e copetente do dom da capacidade para desenvolver um relato perfeitissimo.
    Se a mamã chegou a conhecer a verdadeira história, muito se deve ter divertido durante anos a recordá- la. A minha infância é cheia diáriamente de cenas semelhantes e outras muito piores e, no tempo que chovia e trovojava pelas traquinices, mas como fui crescendo e assumindo a minha responsabilidade e aos meus Pais essas histórias deram-lhe um gozo tremendo e quando me deslocava à aldeia eles não se cansavam de contar ao pormenor essas malfeitorias. Adorei. Eles são tão queridos que não merecem esse castigo, mas dava vontade de encher os Minsitérios e Parlamento. Sempre nos alegravam e poupavam-nos de gramar as relas.
    Mas eles os Grilos são queridos de mais e não merecem tamanha praga.
    Foi maravilhoso recordar, revejo-me no artigo. Mais uma vez parabéns.

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  2. Pois Amigo Leiria, também na minha meninice apanhei muitos grilos com a técnica da palhinha, mas o mais grave é que já com netos , continuei a apanhá los, assim não há muitos anos apanhei um (macho pois só os machos cantam)comprei uma gaiola toda bonita e ofereci ao meu neto, de noite os pais tiveram que se levantar porque o grilo não os deixava dormir, e foram colocá lo dentro da máquina de lavar roupa,e depois ainda tive que ouvir um sermão.
    Um abraço
    Virgilio Miranda

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